O LAUDO CLÍNICO, A SALA DE AULA E O PROFESSOR
- Tendência Inclusiva
- 19 de nov. de 2017
- 5 min de leitura
É comum para os pais de crianças que tem um perfil de aprendizagem fora do padrão convencional, ouvirem da escola que o filho precisa de médico, de medicação, precisa de um laudo! O que querem dizer com isso?
Acontece que conhecer e conviver com pessoas de comportamento social e intelectual diferente da maioria, ainda é um grande tabu para a sociedade e para a escola. Mas ora, não seria a escola o lugar onde esse tabu deveria ser superado? A resposta é sim! O problema é que não estamos preparados para isso e, sendo assim, qualquer dificuldade em ler, escrever, manter a concentração, seguir uma lógica, comportamento agitado ou quieto demais, tudo isso é motivo para que questões sejam levantadas por toda parte, inclusive na escola e essas servem de justificativa para que o aluno siga seu ano letivo sem acompanhar a turma. Pensando por essa lógica, a culpa por não estar dentro do padrão é dela, da criança, então ela precisa se encaixar. Nós, entusiastas da educação que transforma, sabemos que isso não é verdade e precisa ser mudado. A escola deve acolher, libertar, transformar cada criança que ali estiver, proporcionando experiências de aprendizagem que a possibilitem sentir o mundo da maneira mais pura e verdadeira possível, sentindo-se parte dele.
Acompanhando vários pais em reuniões nas escolas para tratar desse assunto, já presenciei falas de coordenadores, supervisores e professores:
“Mãezinha, não se preocupe, seu filho não acompanha a turma, mas se socializa bem”.
“Mesmo que ela não aprenda a ler, ela vai aprender a conviver com as pessoas”.
“Sem um laudo fica difícil fazer alguma coisa porque eu preciso me respaldar”.
“Esse menino está te enganando, ele sabe as coisas, mas é levado demais e precisa de limite em casa, se não, aqui na escola não damos conta”.
“Essa menina é muito esperta, chora a aula toda, ela sabe como fugir e por isso não aprende nada”.
“Já falei mesmo com ela que se continuar copiando devagar assim ela vai ficar de recuperação porque a matéria da prova eu passo toda no quadro, todo mundo copia, só ela que não”.
“Porque você não coloca ele em uma escola que cobra menos dele, tadinho, aqui é puxado e a gente vê que não dá conta”.
“Você já levou ao médico pra ver se não é nada dentro da cabeça dela, porque olhando assim eu acho que é manha mesmo”.
Até que ponto é possível culpar as dificuldades apresentadas pelo aluno em detrimento da não habilidade de um professor ou de uma escola em lidar com esse jeito diferente de aprender? Será mesmo verdade que sem um laudo clínico o professor ou a escola não podem fazer nada para ajudar o aluno? A escola é para todos, ela é de todos e deve acolher a todos.
É importante pontuar que as dificuldades de aprendizagem existem e precisam ser diagnosticadas e acompanhadas por profissionais competentes, mas nos dias atuais é muito comum chegar a uma sala de aula e ouvir do professor (a) que dois ou três talvez mais alunos apresentem dificuldades pontuais ou generalizadas para aprender os conteúdos. Desses, um ou outro possuem um laudo médico e por isso recebem uma atenção diferente por parte da escola (o que está longe demais do ideal, tão longe que na maioria das vezes o problema não se resolve nem se atenua com a apresentação do laudo). Vamos nos ater aqui aos alunos que ainda não possuem laudo médico, que tipo de atenção eles estão recebendo da escola e dos professores?

A educação é direito de todos e de acordo com a constituição:
Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: I – igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; Art. 208. O dever do Estado com a Educação será efetivado mediante a garantia de: III - atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino;
(Constituição Federal, 1988)
A existência de um laudo clínico dever favorecer determinado aluno, sobretudo em relação a garantia de seus direitos de ter atendimento especializado, material adaptado e avaliação coerente com seu ritmo de aprendizagem, mas os alunos que não foram diagnosticados com esse ou aquele transtorno, possuem o mesmo direito a educação como qualquer outro indivíduo e cabe a escola e sobretudo ao professor(a) essa sensibilidade para promover a mudança necessária para uma inclusão efetiva. A inclusão educacional não deve ser pensada somente para as pessoas com deficiência, mas para as pessoas como um todo, assumindo cada aluno como único e com seu perfil de aprendizagem que lhe é próprio. Não é necessário um laudo para perceber a dificuldade de uma criança em ler palavras escritas com letra cursiva e oferecer á ela um conteúdo adaptado em caixa alta. Não é preciso de um laudo para perceber a necessidade de uma linguagem mais clara e objetiva para aquele aluno que não entende o subjetivo, que compreende somente a partir do concreto. Não é necessário um laudo para que aquele aluno que não consegue interpretar as questões da prova seja avaliado de uma maneira mais simples ou receba um modelo de prova mais curta, com menos textos e mais imagens. Não é preciso de um laudo para que o aluno tímido, com baixa autoestima receba estímulos positivos para superar seu sentimento de inferioridade. Não é necessário um laudo para que a aluna que não consegue copiar o conteúdo do quadro com agilidade, recebe o mesmo conteúdo impresso ao final da aula. Não é preciso um laudo para que o professor(a) seja o agente de transformação que seu aluno espera e precisa.
É importante refletir sobre isso, sobre o papel do professor(a) no desenvolvimento de cada individuo. Desistir de um aluno é desistir do futuro. O professor (a) é o agente de transformação que escolheu estar em sala de aula para promover a mudança. Aos alunos que possuem laudo clínico e aos alunos que ainda não possuem, mas apresentam dificuldades durante o processo são resguardados os mesmos direitos, o direito á educação!
Se você é professor(a) e se identificou com esse texto, vamos refletir juntos:
DO QUE ADIANTA TER O PODER DE TRANSFORMAR EM SUAS MÃOS E NÃO EXERCÊ-LO? O QUE TE IMPEDE? A ESTRUTURA FÍSICA E BUROCRÁTICA DA ESCOLA AINDA É UM PROBLEMA, MAS A SALA DE AULA É SUA, O MÉTODO É SEU E O SONHO DE CADA ALUNO PASSA POR VOCÊ!
Todos juntos por uma educação que agrega e inclui.

Tatiane Teixeira Alves é Socióloga, formada pela Universidade Católica de Minas Gerais. Pós graduada em Psicopedagogia Clínica, Educação Inclusiva e comunicação Assistiva pela Universidade Cândido Mendes . Sócia fundadora da Assistiva – Acompanhamento Educacional especializado que oferece o apoio pedagógico para pessoas com necessidades educacionais específicas, sob a premissa de que “Se uma criança não consegue aprender da maneira que está sendo ensinada, é preciso mudar o método de ensino para que ela aprenda”.
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