EDUCAÇÃO INCLUSIVA: NECESSIDADE DE TODOS NÓS!
- Tendência Inclusiva
- 29 de jul. de 2016
- 5 min de leitura
Educação Inclusiva: necessidade e demanda de todos nós (ou “exclua-nos fora” deste mundo inadequado para qualquer um) por Adriana Buzelin e Maria Inês Chaves de Andrade.

Um, dentre tantos infelizes episódios, assombra a educação inclusiva por ora.
O último acontecimento foi o óbice que as escolas particulares de Minas Gerais, através de liminar concedida pela Justiça Federal, querem criar para o acesso das crianças e dos adolescentes com deficiência à rede privada de ensino, da Capital e do interior do Estado.
A Lei Brasileira de Inclusão destinada a assegurar e a promover, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais por pessoa com deficiência, visando à sua inclusão social e cidadania, entrou em vigor em janeiro de 2016, estabelecendo mudanças quanto ao trato da pessoa com deficiência, em diversas áreas, especialmente no que respeita ao trabalho e à educação. A lei foi relatada pela deputada Mara Gabrilli, na Câmara dos Deputados, e pelo senador Romário, no Senado, e previa seis meses para que as instituições públicas e privadas de ensino se adaptassem antes que entrasse oficialmente em vigor, o que se não deu. Pelo contrário, as escolas desconheceram o parâmetro legal e a maior parte delas não providenciou qualquer adaptação.
"Toda criança com deficiência tem direito a um ensino de qualidade e que atenda às suas necessidades" - foi assim que o tema chegou parametrizado para que a lei sancionasse novas expectativas. Mas, apesar de ser proibido por decreto então promulgado, escolas particulares passaram a cobrar uma taxa extra, além da mensalidade, dos pais para o cuidado com seus pequenos, repassando para as famílias tudo quanto se demandava para a promoção da inclusão de seus filhos. Ora, adequação das escolas exige não só investimentos de ordem material, mas imaterial, seja em valores humanos, recursos humanos propriamente ditos, enriquecendo a estrutura de ensino com a contratação de profissionais capacitados para recepcionar o diferente e, por que não dizer, para o diagnóstico das múltiplas diferenças que afinam todos, certos de que ninguém é igual e cada um de nós precisa de um acolhimento singularizado. Cuidando do outro, obviamente, também, cuida-se de si.
Pois, é, mas apesar desta consciência, muitas escolas ainda insistem em não receber alunos com deficiência!
O juiz federal, na instância mineira, convenceu-se de privilegiar os donos das escolas, em detrimento do que a razão proclama, tornada lei. Toda a inibição econômico-financeira que pode viver a escola e que serve como argumentação pela injustiça que querem dizer que sofre, decai frente a própria história da razão humana. Sobre o lombo do homem negro, toda a estrutura sócio-econômica deste país se vincava e a escravidão teve de ser superada. A história da razão humana é uma história de mártires, mas o negro se soergueu íntegro e a própria razão buscou pela confecção do impensado até que, a partir de Getúlio Vargas, direitos trabalhistas entraram, definitivamente, em vigor. E como a escravidão tem nuances muito mais perversas que a própria exploração do trabalho, o homem negro não podia ser excluído do acesso à educação e, hoje, apesar dos percalços, não há uma escola particular que seja que se autorize a impedir uma criança negra de ser matriculada, sob pena da prática do crime de racismo.
Educar um povo é saber-se educado também por ele. Apenas a nossa coexistência igualmente livre, sejamos nós quem formos, em toda nossa pluralidade, em espaços de escola que entendam que isto é educar para a liberdade e a igualdade, pode tornar este país o lugar que queremos para todos os nossos filhos. Não faz muito, as mulheres eram grupo de exclusão no que respeita à sua educação, remanescendo, ainda, outras exclusões, mas estando hoje todas instrumentalizadas para o enfrentamento de qualquer tipo de discriminação que se inscreva a ser feita. E isto porque estão sendo educadas a gerações. Portanto, toda mãe tem de se reconhecer sujeito de história e, por isso, não se pode sujeitar, nem a nenhum de seus filhos de todas as outras mães, porque isto é consciência feminina. Ainda que o bicho-homem tenha um apetite econômico-financeiro que explique a pretensão de deglutir o Outro, apartando-o do acesso à educação, isto não se justifica porque explicações e justificativas não freqüentam a mesma dimensão cultural. Todo algoz há de explicar sua ação, mas nenhuma vítima justifica o horror que praticou.
Todos somos iguais e a diferença é nossa igualdade – de compreensão basilar e simples. Pretende-se conformar como obstáculo o fato de a educação inclusiva, no Brasil, ser ainda medíocre por falta de informação e preparo dos professores e que poucos docentes e escolas estão preparados para receber alunos com qualquer tipo de deficiência. Ora, tolice. Não há como a escola esgrimir falta de informação, sob pena de declarar-se incapaz de educar, seja-lhe bastante a sensibilidade para a oitiva do mundo, pelo menos para a ausculta do mundo culto. As adequações físicas não são maiores do que as já exigidas pela ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas), a NBR (Normas de Acessibilidade a Edificações, Mobiliário, Espaços e Equipamentos Urbanos), em vigor desde 2000. As normas de acessibilidade são de interesse social e são citadas pelas Leis Federais de Acessibilidade. Desde 2004, a ABNT firmou acordo com o Ministério Público Federal para a divulgação e o acesso às normas por qualquer cidadão interessado. Portanto, desconhecer isto e sendo escola há de se ver questionada, sobretudo, por seu comprometimento quanto à cultura que se quer para todas as crianças e adolescentes deste país, incapacitada parece estar a instituição de ensino para lhes oferecer o óbvio para a formação escolar de nosso tempo.
Ora, considera-se discriminação toda forma de distinção, restrição ou exclusão, por ação ou omissão, que tenha o propósito ou o efeito de prejudicar, impedir ou anular o reconhecimento ou o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais de qualquer pessoa e, quanto à criança e ao adolescente com deficiência, inclua-se a recusa de adaptações razoáveis e de fornecimento de tecnologias assistivas nas escolas.
A educação constitui direito de qualquer pessoa deste país, pelo que se tem por lei assegurado um sistema educacional inclusivo em todos os níveis, com oferta de aprendizado por toda uma vida, de forma a que todas as nossas crianças e adolescentes possam alcançar o máximo desenvolvimento possível de seus talentos e habilidades físicas, sensoriais, intelectuais e sociais, segundo suas características, interesses e necessidades de aprendizagem.
Proceder de outra forma é não se permitir comemorar um Brasil paralímpico, com o maior número de campeões paralímpicos do mundo, no momento em que todos os olhos se voltam para assistir as Olimpíadas do Rio. Não nos envergonhe, Minas Gerais, e não se diga que Belo Horizonte é o que se inscreve belo enquanto horizonte para além das montanhas e só. Pessoas com deficiência por aqui nos enchem de orgulho, outras, seja o privilégio da aparência apesar da decomposição da essência...
Essencialmente, educação é outra coisa. Aparentemente, esta que aí está que desapareça.

Maria Inês Chaves de Andrade é mestre em Ciências Jurídico-Internacionais pela Faculdade de Direito na Universidade de Lisboa/Portugal; bolsista do DAAD na Ludwig-Maximilians Universität em Munique/Alemanha; doutora em Filosofia do Direito pela FDUFMG. Tem pós-graduação em Cinema pelo IEC/PUC. É autora na área de literatura jurídica, literatura infantil, romance e poesia. Vice-presidente da ONG “O Proação”, em Belo Horizonte, sob a convicção de que “ser humano precisa ser humano”, reconhece, no trabalho sem fins lucrativos - não caritativo, perceba-se - o germe ínsito de um capitalismo selvagem que rui a olhos vistos, sejam os lucros adstritos a valores sem preço e de desmedida de riquezas interiores, recursos humanos, verdadeiramente, dos quais já não nos podemos abster por abastança e necessidade.

Comments