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TUUMMM...

  • Foto do escritor: Tendência Inclusiva
    Tendência Inclusiva
  • 5 de fev. de 2017
  • 3 min de leitura

O barulho da grande porta de ferro batendo ao ser fechada ecoou dentro de mim. O pulo discreto veio quase como um reflexo. Não tinha como esconder meu nervosismo de marinheira de primeira viagem. Já havia estado ali como jornalista, para entrevistar, em uma situação completamente “imparcial”. Mas agora era diferente. Ao invés do bloquinho de anotações, eu tinha comigo uma bíblia. As perguntas deram lugar às palavras de esperança. E foi uma tarde incrível!

Após a grande porta de ferro, que foi batida por um agente da Unei (Unidade Educacional de Internação) Dom Bosco, dei de cara com um corredor não tão comprido, um pouco sujo e bagunçado. Eram aproximadamente quatro celas de cada lado. No primeiro momento, percebi apenas mãos penduradas, alguns braços tatuados e muita conversa. Respirei fundo e tentei deixar de lado o nervosismo. Junto com meu companheiro de missão, passei em cada cela cumprimentando um a um dos que estavam para o lado de dentro.

O momento começou com músicas, louvores, depois a leitura da Bíblia, uma reflexão e, finalmente, batemos um papo com os meninos.

Confesso que em alguns momentos fiquei apreensiva, me assustei com certas atitudes deles e estava ressabiada em falar muito da minha vida. Mas aos poucos fui relaxando. Depois me senti mal por perceber como cada movimento era tão pré-julgado por mim... Vi, ali, o quanto ainda tenho me esvaziar dos meus preconceitos. Mas é isso aí, a vida é um exercício diário e contínuo.

Algumas vezes, entre uma oração e um susto, me peguei perdida no pensamento, olhando para o rosto de cada um deles e tentando imaginar o que os levou a estarem ali, atrás daquelas grades. Algumas vezes meus olhos marejaram e senti um nó na garganta. Queria eu dar oportunidade àqueles garotos. Quem dera eu conseguisse pegar cada um pela mão e mostrar que um caminho do bem vale muito mais a pena. Mas tudo o que eu tinha a oferecer eram meus ouvidos, algumas palavras de incentivo e minha oração. Senti-me um pouco impotente. Mas sei que é assim mesmo.

Depois da oração, veio o momento de conversa e isso eu gosto de fazer. Conversei com o máximo de meninos que consegui. Alguns me bombardearam de perguntas, outros desabafaram sobre o quanto que gostariam de mudar de vida e sobre o quanto isso parece ser difícil.

Um deles ganhou um pouco mais da minha atenção: (vou chamá-lo de José, para não expor o nome verdadeiro). Ele disse que queria mudar de vida assim que saísse da Unei. Fiquei empolgada, tentei ao máximo motivá-lo, contei como era bom ser uma pessoa boa. Disse que ele poderia dar um passo de cada vez, mas que o primeiro passo e o mais importante era o de deixar Jesus caminhar junto.

Quando saímos de lá, acabei prolongando o papo com um dos agentes (meu lado jornalístico falou mais alto e eu metralhei o cara de perguntas). Nesse tempo que estávamos lá fora conversando, ouvimos gritos vindos de dentro da ala de onde acabávamos de sair. O agente explicou que haviam transferido um menor para lá e que o barulho era porque os outros garotos que já estavam naquela ala começavam a organizar um debate para decidirem se o menino recém-transferido poderia ou não continuar ali. E quem liderava este debate era o JOSÉ.

Fiquei triste. Ele havia me dito há poucos minutos que queria mudar de vida e num piscar de olhos já estava fazendo tudo ao contrário. Fiquei muito triste. Como se a nossa conversa tivesse sido em vão, jogada pelo ralo.

Saí de lá com um misto de sentimentos: impotência, compaixão, frustração, caridade... Mas de tudo, prevaleceu a vontade de voltar. Pensei que o mundo nunca vai desistir de nenhum deles. Então, eu também não posso desistir.


imagem retirada da internet

Ouça a leitura do texto acima com Viver Eficiente!



Mariana Monge é jornalista, escritora, blogueira, letrista... Me resumo em frases, aspas, parágrafos e histórias (minhas e dos outros). Fora isso, tenho vários talentos ainda desabrochando em mim e sempre me permito ser algo novo. Três-lagoense por natureza, campo-grandense por criação, mineira por encantamento e carioca por puro deslumbre.

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